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A Invenção de Hugo Cabret

Crítica – A Invenção de Hugo Cabret

Tinha uma coisa me encucando desde que vi o primeiro trailer deste filme. Como assim, uma fábula infanto-juvenil em 3D, dirigida pelo Martin Scorsese? Scorsese nunca fez um filme infantil, até onde sei… Enfim, fui ao cinema ver, incentivado também pelos 11 Oscars que está concorrendo (a  premiação é amanhã!). E posso dizer: A Invenção de Hugo Cabret é um filmaço!

Paris, anos 30. Hugo é um órfão que vive escondido pelos engrenagens dos relógios da estação de trem. Seu pai lhe deixou um autômato, que ele tenta consertar – até descobrir que o autômato pertencia a George Méliès, diretor de cinema, o grande precursor do cinema de ficção.

A primeira dúvida que heu tive era como seria o estilo do Scorsese em um filme direcionado aos pequenos. O cara é o autor de vários fimes excelentes, mas sempre com temas adultos, e muitas vezes violentos –  como Taxi Driver, Os Bons Companheiros, Cabo do Medo, Gangues de Nova York e Ilha do Medo. Neste aspecto, A Invenção de Hugo Cabret difere de sua filmografia, e pode ser classificado como um novo clássico infanto-juvenil.

Mas que ninguém pense que A Invenção de Hugo Cabret é só para os pequenos. Adultos também vão apreciar o filme, principalmente aqueles que são fãs de cinema. Poucas vezes a magia do cinema esteve tão bem representada nas telas. E em alguns momentos, parece que estamos vendo making offs dos filmes de George Méliès!

Outra coisa que chama a a tenção aqui é o 3D. Quem me lê sempre, sabe que não sou um fã dessa “febre 3D”. Um filme não precisa de 3D para ser bom, a não ser que seja um filme do estilo “circense”, tipo Dia dos Namorados Macabro, Fúria Sobre Rodas ou Piranha, onde o 3D faz parte da diversão (e você tem que se abaixar pra desviar das coisas atiradas na direção da câmera). E ainda é pior quando um filme é feito usando os meios convencionais e posteriormente convertido para 3D, aí a gente vê como o efeito é artificial e desnecessário. Pois bem, o 3D de Hugo Cabret é um dos melhores já feitos até hoje. Em algumas cenas, a gente realmente sente a profundidade, como nos flocos de neve, ou na cena do aquário usado por Méliès (quando ele filma através do aquário). E Scorsese mostra que está em plena forma, quase aos 70 anos (que ele completa em novembro deste ano) – alguns travellings em 3D pela estação são belíssimos!

O elenco é outro destaque. O pouco conhecido Asa Butterfield interpreta o personagem título; Sacha Baron Cohen (o Borat!) está excelente como o inspetor da estação; Chloë Grace Moretz, minha atriz mirim contemporânea favorita, também está ótima, como sempre (como em Kick-Ass e Deixe-me Entrar). Ainda no elenco, Ben Kingsley, Christopher Lee, Jude Law, Ray Winstone, Emily Mortimer e Michael Stuhlbarg.

A Invenção de Hugo Cabret é o grande favorito para o Oscar amanhã, está concorrendo a 11 estatuetas, incluindo melhor filme e melhor diretor (Scorsese já foi indicado sete vezes para melhor diretor e duas vezes para melhor roteirista, mas só ganhou uma vez, como diretor, por Os Infiltrados). A concorrência este ano está boa, se Hugo Cabret ganhar, será legal; mas se perder para O Artista, não será injusto.

Por fim, preciso falar mais uma vez do título nacional. O filme foi baseado no livro homônimo, escrito por Brian Selznick , então o erro desta vez não é do tradutor brasileiro. E parece que o livro originalmente se chama “The Invention of Hugo Cabret”, ou seja, o erro vem de mais longe ainda. Mas, será que alguém pode me explicar que “invenção” é essa? Hugo Cabret não inventou nada, a invenção é de George Méliès… O nome original do filme é mais correto: “Hugo“.

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O Artista
Micmacs à Tire-Larigot

Ilha do Medo

Ilha do Medo

Uêba! Filme novo do Scorsese nos cinemas cariocas!

1954. Dois agentes federais são mandados à Ilha Shutter, onde funciona um hospital psiquiátrico, para investigar o desaparecimento de uma paciente. Uma grande tempestade os impede de sair da ilha, e eles acabam descobrindo que existe algo de estranho com a ilha.

Ilha do Medo chama a atenção por ser um “filme de gente grande”. Enquanto Hollywood está cada vez mais infestada de novas pequenas produções, sempre econômicas, é legal ver um filmão à moda antiga, com bons atores, trama bem elaborada, fotografia bem cuidada e trilha sonora impactante. De quebra, os efeitos especiais são discretos e perfeitos.

Este já é o quarto filme de Scorsese com Leonardo DiCaprio no elenco principal (os outros foram Gangues de Nova York, O Aviador e Os Infiltrados). Parece muito, mas na verdade, Scorsese já fez parcerias assim antes, como ao lado de Robert de Niro (acho que foram oito filmes até agora: Caminhos Perigosos, Taxi Driver, New York New York, Touro Indomável, O Rei da Comédia, Os Bons Companheiros, Cabo do Medo e Cassino). DiCaprio ainda não é um De Niro, mas já se destaca como um dos melhores atores de sua geração.  Ao seu lado, Ilha do Medo conta com um elenco de primeira, com nomes como Mark Ruffalo, Ben Kingsley, Max Von Sydow, Michelle Williams, Emily Mortimer, Patricia Clarkson, Jackie Earle Haley, Elias Koteas, entre outros. Todos estão ótimos! (Aliás, os dois últimos que citei, Haley e Koteas, estão assustadores!)

Adaptação do livro Paciente 67, de Dennis Lehane (o mesmo que escreveu o premiado Sobre Meninos e Lobos), o roteiro de Ilha do Medo nos leva a uma interessante viagem, onde não sabemos exatamente o que é mentira e o que é verdade. Acredito que parte do público pode não gostar, já que nem sempre o que está na nossa frente é a verdade… E uma prova de que estamos diante de um filme diferente do “mais do mesmo” é o cuidado com a fotografia em cada cena. Imagens belíssimas compõem o resultado, em pouco mais de duas horas de projeção.

Um detalhe curioso sobre a música do filme: a trilha sonora não é original, composta para o filme, são temas clássicos. O tema principal é a assustadora Sinfonia número 3 de Penderecki. Independente do filme, dá medo de ouvir.

Não sei se Ilha do Medo entrará para a história como um dos grandes filmes de Scorsese, afinal, o cara já fez muita coisa boa. Mas podemos afirmar que estamos diante de um dos melhores filmes deste 2010 que começou há pouco!

Rolling Stones – Shine a Light

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Rolling Stones – Shine a Light

Que tal uma das maiores bandas da história filmada por um dos maiores diretores da história? Interessante, não?

Em Shine a Light, o diretor Martin Scorsese (Taxi Driver, Touro Indomável, Gangues de Nova York e mais uma penca de filmes bons) filmou shows realizados em 29 de outubro e 1º de novembro de 2006, no Beacon Theatre, em Nova York. E nos mostra isso num dos melhores documentários da história do rock’n’roll.

Por que este é considerado um dos melhores documentários da história? Porque é um filme do Scorsese antes de ser um filme dos Stones. Então, em vez do glamour que se espera, vemos a banda “nua e crua”, de perto, muito perto.

De um tempo pra cá, a idéia de “show dos Rolling Stones” se associou a tudo mega, tudo gigantesco. Já vi muitos shows no Maracanã, mas o único que posso dizer que a banda não ficou “pequena” foi quando os Stones tocaram lá, nos anos 90. (Também vi o show da Apoteose, mas dispensei o da praia de Copacabana – heu não sou vip e não teria condições de ver nada no meio da multidão de um milhão de pessoas.)

Mas aqui vemos tudo de perto. Conseguimos literalmente ver todas as rugas de cada um dos quatro Stones: Mick Jagger (vocal), Keith Richards (guitarra), Charlie Watts (bateria) e Ronnie Wood (guitarra). Vemos todas as poses e caretas de Keith Richards – digam o que quiserem dele, o cara inventou boa parte do que conhecemos como “guitarrista de rock”. Também vemos um Mick Jagger de 65 anos de idade rebolando no palco como se fosse uma garotinha – e, mais uma vez, digam o que quiserem, mas o cara é um frontman perfeito, como poucos na história, e nunca – NUNCA – seus rebolados parecem forçados.

(nota explicativa: Ronnie Wood é o único que não é da formação original, desde os anos 60. Brian Jones, o guitarrista da primeira formação ao lado de Keith Richards, morreu em 69, e foi substituído por Mick Taylor, que ficou até 74, quando finalmente entrou Wood. O baixista Bill Wyman se aposentou em 93. Desde então o baixo é tocado por Daryl Jones, mas este nunca foi efetivado membro da banda, apenas músico contratado.)

Vemos tão de perto que acontece algo raro: o som que ouvimos, aparentemente, não foi mixado. Quando a câmera está perto de um dos músicos, ouvimos o seu instrumento mais alto, como se estivéssemos perto do retorno do palco! Isso às vezes bagunça o áudio, e muitas vezes não ouvimos direito os outros instrumentos. Mas não deixa de ser interessante…

Entre as músicas, vemos trechos de entrevistas de outras épocas. E aí está um dos poucos defeitos do filme: custava colocar as datas destas entrevistas? É legal ver um Mick Jagger novinho, ainda nos anos 60, dizendo que talvez eles ainda tivessem pique pra tocar por talvez mais uns dois anos. Acho que todas as imagens de arquivo deveriam dizer pelo menos o ano!

Mesmo assim, vale o ingresso / locação / download. E bom filme / show!